quarta-feira, 13 de julho de 2011

A fuga das lembranças



Engraçado. Nesta fase da minha vida não tenho muitas lembranças dos amigos, das conversas, das brincadeiras. Da infância e das boas lembranças algumas poucas, das ruins muitas. Gostava de brincar em beira de rios, subir em árvores, fazer cabanas. Talvez um dia fale mais sobre elas. Não é fácil lembrar de coisas ruins. Eu era um garoto travesso e arteiro como dizia mamãe. Papai quase nunca estava em casa - era vendedor viajante e capataz de fazenda - e quando estava gostava de rinha de galo, dos botecos e dos amigos pelos quais era muito considerado o Índio Véio como era conhecido. Eu morria de vontade de ir com ele mas ele nunca me levou. Na verdade nunca me pegou nem no colo e quando eu aprontava aquelas coisas de criança, ele pegava um balaústre, sabe aquelas ripas de madeira que se usa geralmente para fazer cercas, com um corte diagonal em uma das extremidades formando uma ponta? Então, era assim que ele me corrigia. Ficava horas de molho em uma bacia com água e sal para tirar as marcas e os vergões , não sei de onde mamãe tirou essa receita ou talvez ela nunca tenha apanhado assim. Só sei que doía muito. Tinha também o lado bom do papai. Ele fazia questão de dizer às pessoas que eu era um menino muito inteligente e de alguma forma isso compensava os maus tratos, acho. Gostava também do modo como se vestia, estilo boiadeiro, chapéu calças jeans surradas (não, ele não batia nas calças) laço e chicote. Não era só um estilo, ele era mesmo um boiadeiro. Nesse tempo ele era capataz de uma grande fazenda.

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